domingo, 27 de setembro de 2009

Diferencial Diagnoses

O processo é simples. Primeiro sentar e respirar. Depois organizar o caos, retirar o que atrapalha, eliminar (nem que seja literalmente) as desculpas. Por fim, ver-se frente a frente com o que resta (ou deve, como queira) ser feito, para que certa teoria seja confirmada. Penso que isso também vale para os objetivos. E os sonhos.

Eu minto tão mal que meu pai percebeu que a mentira que eu escondia dele era verdadeira. Claro que ainda não temos uma solução, mas ele já sabe, ou melhor, nós já sabemos, que passar os finais de semana em outra cidade cuidando do meu avô não me faz bem. Ele não sabia, mas eu não conseguia mais esconder o mal estar que me acomete sempre que o final de semana se aproxima. Todas as semanas. Se alguém tivesse gravado minhas ligações, perceberia que a raiva que emana da minha voz toda sexta-feira não é humana. Isso sem falar nos sintomas que o meu mais-que- consciente estava desenvolvendo pra ver se eu me safava. De cefaléias bizarras a contrações abdominais.

Dois finais de semana de folga depois, ou melhor, antes de um colapso total, eis que eu me vejo diante de uma mesa arrumada e pronta para começar o que deve ser feito. Estudar. A casa não está uma zona, os gatos comeram, eu já jantei. Isso sem falar que venho tomando café da manhã todos os dias há mais (senão exatamente) de duas semanas. Estou até escrevendo um post.

O que causa caos pessoal, desatenção no trabalho, fuga e mediocridade aguda?
Diagnóstico: Cansaço.

E o que causa o cansaço?

Não é a vida, nem a situação com meu avô somente. Ela, a situação, é apenas, digamos assim, um estresse não intencional que levou ao agravamento dos sintomas subsequentes. Ou seja, cansaço pode ser a resposta mas não é a causa. Já antecipo que eu realmente não sei a causa, mas tenho algumas teorias.

Primeiro, os sintomas surgidos com o cansaço não são novos. Desde sempre, se as minhas coisas (e por isso entenda-se meus papéis, minha casa e minhas roupas) estão na mais profunda bagunça, é sinal de que algo não anda bem. Se eu passo muito tempo arrumando-as, demonstra-se uma tentativa quase frustante de, arrumando o exterior, fazer o mesmo com o interior. Sinceramente falando, eu sou a mestra das fugas. E sou melhor ainda em fugir das coisas que eu não gosto de fazer. Ninguém vai me ver fugindo de um bom prato de macarrão, de um livro novo do Harry Potter, ou de uma boa oportunidade de sexo. Não. Mas eu fujo de um almoço sem graça, de um livro chato, ou de um cara que só sabe brincar com o próprio brinquedo.

Por outro lado, não fujo em desabalada carreira para qualquer lugar. Só quando estou em pânico, mas aí não conta. A fuga em mim se manifesta de duas maneiras: 1. Correr em direção ao que eu quero, ainda que não pelo caminho real. 2. Autosabotagem.

Vou começar pelo fim. No segundo caso, na hora parece não fazer sentido, mas depois é praticamente uma tabela do excel. A sabotagem é sempre semi-inconsciente, baseada em argumentos realmente ruins, que na hora fazem muito sentido. Eu me autosaboto para me proteger. É, bizarro, eu sei. Por exemplo, se eu não estudei para uma prova. Não posso simplesmente não ir ou não responder as questões. Não. Mas posso beber feito louca na noite anterior e ir direto do motel para a prova. Ou, acordar na hora, tomar banho e perder os óculos antes de sair. Ou ainda, sair no horário exato para a prova e chegar lá no exato momento em que os portões fecham na minha cara. Eu sou tão boa nisso, que na hora da dor (ou raiva) maior, eu tenho certeza que a culpa não é minha. Depois, bem depois, não faz diferença, e eu me salvei de falhar por pura incompetência. Não foi não estudar que me fez não passar.

Como na música, o movimento da fuga é mais sútil e muito mais divertido, com efeitos colaterais mais fortes e, na maior parte das vezes, muito mais agradáveis. As vezes ilusórios, verdade, mas não sempre. Por exemplo, estou andando/correndo uma hora três vezes por semana. Sim, foi porque eu vi o House correndo. Mas ele já não corre mais, eu sim. Eu não fujo assistindo qualquer coisas. Vejo séries médicas e dramas humanos em doses cavalares, lavo o banheiro para não abrir a apostila, estendo roupa atrasada para ir trabalhar, passo horas fazendo nada na internet, brinco com o gato, faço listas imensas de coisas que eu devo fazer mas que, honestamente, não fazem muito sentido.

Sintomas. Diagnóstico que explique todos os sintomas?

Hoje eu ouvi uma entrevista com a autora do livro Mentes Inquietas, falando sobre o Deficit de Atenção e de como ele pode persistir em adultos. Eu não me encaixo em todos os sintomas. Pra falar em verdade, só em um (além dos transtornos causados pelo não tratamento da condição). Ela disse que a criança com o déficit se dedica a coisas pelas quais ela se apaixona. É capaz de passar horas fazendo (lendo, estudando, montando, pintando, qualquer coisa) aquilo. Não como todas as pessoas, mas de forma profundamente concentrada. Eu sou assim, e não estou me gabando. É quase doentio. Eu li "A ordem da Fenix" em 28 horas sem parar para ir ao banheiro. Assisti a 3a temporada do House em uma semana. Passava a tarde toda na biblioteca estudando bioquímica sem comer. Isso sem falar nas coisas estúpidas que fiz por um cara. Até concordo que isso não é lá muito salutar, mas eu não quero ser como as outras pessoas, incapazes de ler um texto por mais de meia hora.

O problema, e sim, já estamos chegando ao fim do texto, é que eu preciso desta paixão para fazer as coisas. Assim: eu quero muito, mas muito mesmo, ser médica. Só que não tenho o menor tesão em ficar estudando coisas que eu já estudei por quatro anos! Elas estão apagando da minha memória, mas eu lembro perfeitamente que eu já vi isso. E não acho nada divertido ficar sentada resolvendo problemas de MUV quando eu podia estar aprendendo, sei lá, funções hepáticas alteradas. Então, pausa, eu preciso de algo que lembre, sensorialmente, o porquê de fazer essas coisas. E aí, entra a ficção e as séries médicas!!!

No melhor estilo House: a paciente tem DDAH não tratado, o qual, além de causar surtos depressivos e síndromes de ansiedade, se manifesta através de uma necessidade de tesão para seguir em frente. As séries médicas que ela consome em profusão suprem essa necessidade, e os exercícios físicos mantém a adrenalina e a endorfina altas. A necessidade da administração desses remédias está condicionada à situação atual. Voltando a paixão, desaparece o cansaço, e, consequentemente, a fuga e a autosabotagem.

Eu não sou apenas uma viciada. Eu sinto uma espécie do dor e preciso disso para me manter focada.

E realmente me identifico com o House.

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