sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

O Blog dos Outros

http://ansia2.blogspot.com

Então a Julie me mandou um link para a entrevista de uma moça que publica fotos graciosíssimas e desenhos interessantes no Flickr. Fui lá ver e me deparei com um blog bem interessante. Aí vc me fala, então porque vc simplesmente não segue o dito cujo?

Talvez eu siga, não sei. Tem coisas superlegais, como o contador de animais abatidos, e idéias com as quais simpatizo profundamente. Feminismo, ativismo. Tudo redigido de forma solta e muito gostosa. Isso sem falar na minha mais profunda admiração por pessoas que fazem coisas em que acreditam. Por outro lado, a maior parte das expressões usadas lá eu nao tenho a menor idéia do que significa, e embora eu admire e simpatize com o movimento punk, riot girll e etc, não dá pra dizer que eu me identifico com tudo isso. Gosto da estética, da idéia, das influências e tal, mas, como já disse para a própria Julie uma vez, bandas de moças gritando não são muito bem a minha praia.

Talvez eu não siga,não sei. Mas não podia deixar passar em branco a visita que fiz ao Cabeça Tédio, e nem deixar de elogiar a entrevista simples e rica com a MAREN a.k.a. FRLZUCKER! publicada lá no dia 3 de dezembro.

Ao som dos sons do prédio e dos barulhos da cidade.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Coisas que se escreve por aí...

Às vezes sou acometida de uma vontade quase incontrolável de escrever. São coisas que sinto e se me aparecem em forma de frases piscantes em neon laranja dentro do cérebro. Dos felizes acasos da vida, ganhei um celular com teclado que se transforma em QWERTY e me deixa escrever a qualquer hora, de qualquer lugar. Ou quase, já que quem não tem dinheiro tem medo, e se me levam o pequeno Jet, nunca mais consigo comprar outro.

O caso é que agora, quando saio do cinema, do teatro ou volto de bons momentos entre amigos, os 15 minutos de metrô transformam-se em quase ou mais de 15 linhas frescas sobre o que sinto, ou penso, no momento. E já que ninguém vai mesmo lê-las, que não as leiam aqui:


A Descoberta

Entao, a gente pode fazer como se,fosse escrever um e-mail e escrever um texto pra gente mesmo e guardar. Texto, alias que pode vir a ser, de, fato, um e-mail, ainda que pra gente mesmo. Como se no fim a coisa, fosse o que é, independente de pra quê for.


Lua Nova - 24.11.09 00:00

Eu sinto falta de amar e percebo como a gente subestima a solidão. Se amar dói, a dor é quente, pungente, nos ocupa por inteiro. A dor se torna tudo, não parte. Colore tudo de preto, verde e cinza. Dói tanto que se quer mais dor, a alegria alheia repuguina. Mas o amor só em parte, ou só fim é dor. E se eu digo fim é porque não amo há tanto tempo que não sinto mais a eternidade dele. Eu penso que não morre nunca, mas sinto que muda. Que, de repente, de repente até demais, não se ama mais. Num único momento, tão preciso e memorável quanto o da descoberta do amor, se constata que não se ama mais. E então o sol que acendeu naquele dia se esconde, as cores perdem o brilho e a música pára de tocar. É o fim. Resta ainda algo de hábito e um pequeno interruptor. Mas a grande ópera chegou ao fim.

Cabe dizer que não foi aí minha grande dor. Isso foi a morte. O que me doeu foi morrer, a grande doença, o saber da morte. Claro, isso pra mim. Imagino que quando o amor morre de repntr deve ser uma dor do caralho. Como toda dor de amor.

Já a solidão, é diferente. Dói, mas é uma dor do cacete. Dói de forma cruel. Dói lento e sempre. Não te aquece, não te congela. Mas te deixa com um calor que enfraquece e com um frio que incomoda.



13.12.2009 00:51 Esclarecendo coisas

Uma coisa, pelo menos, deve ficar clara: o passado foi muito bom, mas não é tudo o que existe. Dormi pouco. Bebi muito, transei muito, aprendi muito, li muito, falei muito, ouvi muito. Amei pra caralho. Amei demais. Vivi. Foi ótimo e é passado.

Hoje as lembranças são boas, mas contar e ouvir as mesmas historias é desbotar o desgastado. Não tem o mesmo som, nem a mesma cor. Até lembrar não é mais a mesma coisa. O amor só mudou de cor, como diz a música, agora tá desbotado.

Se isso posto não o suficiente, vamos esclarecer certos pontos. Primeiro, eu não sou perfeita. Segundo, eu não sou idiota. Nunca fui nenhum dos dois, dificilmente serei. Terceiro, eu mudei, principalmente porque amadureci. Porque amar me fez crescer.

Há mais ainda o que acrescentar. Os meses, quase anos, em que passamos nos "amando" por todos os cantos da cidade, eu amava sincera, profunda e loucamente outra pessoa. Você foi a tentativa risível e infrutífera do meu corpo tentar esquecer o que não podia ter.

Sim, a quimica era boa. O menor canto de pele, o botão que só voce sabia apertar para ligar o circuito todo. Sim, eu gostava de você. Mas não desse jeito. Não como se fôssemos ou viéssemos a ser namorados, um casal.

E não, eu nunca te amei.

domingo, 29 de novembro de 2009

Danko, Dankemo.

Vai parecer triste mas não é. Eu sinto falta de uma religião nos melhores momentos da vida, não só nos piores. É nos ganhos, e não na perda, que eu mais queria ter fé.

Vou ser sincera. Quero que Deus exista, assim, com D maiúsculo. Quero que todas as coisas que o espiritismo diz que são, sejam mesmo. Quero que exista espítirito, colônia, energia, mentores. Quero que exista algo além da vida mundana e inexpressiva que vivemos. Quero que exista um objetivo no existir. Quero que exista "o além".

Quero que lá, no além, exista um cartório de registros. E que lá, no cartório de registro, conste no livro que eu agradeço profunda e sinceramente a noite maravilhosa que tive hoje. Conste também o amor e a gratidão indescritíveís que sinto pelo pai que tenho. Conste que quero ser feliz e realizada só pra que ele saiba e fique feliz com isso também. E que conste, para encarnações futuras, que eu não posso beber muito porque fico sentimental demais.

Sobrando espaço na folha minha sobre gratidão, quero também agradecer pelos meus gatos. É sorte demais ter um pai tão maravilhoso, a Mitsy tão, tão indescritível, o Morpheus tão carinhoso e a Agatha tão viva. É perfeito e eu agradeço, sem jamais abrir mão disso.

E existindo o além, parece posto que, sempre que se agradece, há que se pedir. Não deveria ser assim. No meu mundo perfeito, agradecer basta. E para mim basta. Mas, se há que se pedir, peço que eu sempre possa ver o necessário pra se manter tudo o que tenho. A única coisa que eu quero além é fazer algo pelo mundo. Fazer a minha parte. E se, por um acaso bizarro qualquer, a medicina não for o caminho, que algo ou alguém me possa desenhar qual é.

E se se pudesse pedir mais, eu gostaria de pedir o impossível. Pedir que meu pai nunca morra, que a Mitsy nunca me deixe sozinha. E que se isso não for possível, que partamos nós três no mesmo dia. Não sei como, não sei quando, mas que nenhum de nós venha a sentir a falta do outro.

Porque não seria algo possível de se aguentar.

Dankon Siñoro.


"Querido Deus,


Obrigada.

Seja Baco o arauto da minha gratidão, nem por isso menos sincera ela o é. Grata pelo bem que restou no mundo, grata por minha família, grata pelos meus gatinhos, grata pelos meus amigos. Obrigada, Deus, pelo meu pai que foi além da dor e da perda pelo meu futuro. Obrigada pelo futuro que hoje se torna presente, sem por isso extinguir-se em si. Obrigada pela vida. Perdão pelo desleixo e descaso com que deixo os dias se esvairem em rotina e mediocridade. Obrigada por tanto amar. Perdão por não amar mais. Grata por tanto amor. Perdão por não lembrar desse amor sempre. Perdão pela solidão e obrigada pela consciência.

Desejo sinceramente que o Senhor exista e que haja sentido e verdade quando eu digo: Obrigada, Senhor.

Um simples abraço,

Trinity Ohara"


(Porque São Francisco é foda!!!!)

"Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor,
Onde houver ofensa , que eu leve o perdão,
Onde houver discórdia, que eu leve a união,
Onde houver dúvida, que eu leve a fé,
Onde houver erro, que eu leve a verdade,
Onde houver desespero, que eu leve a esperança,
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria,
Onde houver trevas, que eu leve a luz.

Ó Mestre, fazei que eu procure mais
consolar que ser consolado;
compreender que ser compreendido,
amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe
é perdoando que se é perdoado
e é morrendo que se nasce para a vida eterna..."

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Adios, Abuelito.


"É assim. Primeiro seu avô fica doente e todo mundo faz de tudo pra resolver a situação. Ele passa o Natal no hospital. Sai de lá no Ano Novo. Esperança. Mas nada se resolve e ele continua doente. Depois, ele tem um dia realmente ruim, com muita dor, fraqueza, desmaio, convulsões. Nesse dia vc chora no corredor do hospital porque acha que ele vai morrer ali, esperando atendimento e ninguém fazendo nada. Mas ele, mais que felizmente, não morre. Também não se cura. Num próximo dia, ele sente uma dor indescritível, daquela que remédio nenhum faz efeito. O médico dá um remédio muito, mas muito, forte. Você vê seu avô vomitando sangue e pensa que nada daquilo estaria acontecendo se vc tivesse estudado direito para o vestibular e já fosse médica. O médico, que estudou muito, chama os filhos e lhes diz que o câncer foi para os ossos e para o pulmão, que em dois, no máximo três, meses, ele já não estará mais ali. E que não há nada a fazer. Isso foi em março.

Então são dois meses em que não há limite para a dedicação. Todos se lembram do prazo e ninguém aceita o "nada a fazer". Ainda bem. Médicos, exames, consultas, remédios, brigas pelo melhor tratamento. Você vai lá quase todo final de semana, passa nervoso por não vê-lo melhorar. Dias ótimos de muita conversa e alguma risada, outros tristes de muito dormir e muito silêncio, dias de nada a fazer. Chega a Páscoa, a última grande festa. Dia de sol, cama no quintal. Passa a Páscoa, chega Corpus Christi. Os médicos estavam errados. Dúvidas.

Continua-se os médicos, os exames, os remédios. Novos sintomas, velhas doenças. Novas doenças, velhos sintomas. Corre-se, mas sem desespero. Quando e como saber se o melhor é o que fará o maior bem? Você sabe que as coisas estão erradas. Você não sabe o que nem como é o certo. Você se sente cansada. Já se foi metade do ano, o vô não melhora, não caminha reto para sair da cama. Vc se sente mal por não se sentir bem. Vc se culpa por não querer passar mais um final de semana lá. Vc começa a achar que está "perdendo" os finais de semana. Os temores nascem do cansaço e da solidão. Brigas, discussões, raiva. Não do seu avô, mas da vida. Vc começa a achar que a culpa é dele. Vc começa a achar que a culpa é sua. Vc começa a achar que todo mundo tem culpa. E ninguém tem, realmente, culpa.

Agosto, setembro. Ainda algum médico, muitos remédios. Exames atrasados. Agora uma enfermeira. De repente, uma melhora perceptível. Ele volta a te contar as velhas histórias. Você fica feliz e lembra o quanto gosta de ouvi-lo falar. Ele vai pro hospital. Trombose. Está doente mas está bem. Conversa até ficar rouco, troca experiências com o vizinho de quarto, faz exigências às enfermeiras. Acredita que muito em breve vai voltar a andar. Chora pro médico ao receber alta: queria sair de lá andando. Volta pra casa. Come favas, pede tremoço, ensina a neta do meio a torrar amendoim. Ela os queima, ele faz piada, descasca um a um pra ver qual se aproveita. Ensina de novo. Toma suco, pede a comida da vizinha que nunca cansa de mima-lo. Você se sente no auge do cansaço. Seu pai percebe. Tira férias pra ficar lá com ele e vc poder viver sua vida. Você se sente grata, marca mais médicos, cobra exames, controla remédios. Acredita que a situação está se estabilizando. Mais uma ou duas consultas e ele fará fisioterapia. Poderá andar de cadeira de rodas. Sonhos.

04 de outubro. Seu pai faz churrasco de pão. Faz mais de duas semanas que vc não vai lá. Passa no mercado compra tremoço e azeitona preta. A família está quase toda lá. Tem churrasco de sardinha, de salmão, de salsicha, de pão. Vc corre pra lá e pra cá. Quer ficar ao lado do seu pai, quer ficar junto do seu avô, quer brincar com o gato, com o cachorro e com a sua priminha. Euforia. Faz sol. Vc ouve uma ou duas das velhas histórias do seu avô. Leva azeitona pra ele. Tremoço. Cerveja preta. Sardinha. Tomate. Lazanha de beringela. Cai a tarde. Beijo de despedida no seu vozinho. Gratidão.

10 de outubro. Vc pensa em levar o vô na praia. Chove. Vc não sai de casa.

11 de outubro. Vc dorme o dia todo e então é tarde demais para ir à praia. Fazia sol. Mas é tarde demais.

12 de outubro. Chove. Vc pensa em passar lá para ver como ele está. Mas chove. A preguiça te vence. Consciência de que deveria ter passado lá pelo menos um dia. Vc se desculpa porque sabe que no outro final de semana é seu dia de ficar lá.

14 de outubro. Seu pai te manda um sms. Levando o vô no hospital. Vc lê cinco horas depois. Liga. Internação, pneumonia, saturação em 70. Pai confiante na melhora vai pra casa e te deixa confiante também. Depois do trabalho, vc vai ao hospital. Ele, com um monitor que apita e não mostra os números, olha pra você e balança os ombros. Não dá pra entender bem o que ele fala por causa da máscara. Ele pede uma foto. Vc não entende, mas tira e mostra. Ele vê e balança os ombros. A máquina faz barulho, não dá pra ouvir a TV, que vira outra máquina de barulho. Vc não segura a mão dele, não sei porquê. Vc coloca a mão sobre o ombro dele pra dizer que está ali. Ele pede pra tirar: o peso da sua mão repousando é muito pra ele. Vc coloca a mão no braço. Idem. Vc passa a noite lá. Ele diz para a enfermeira que o medica "essa é minha neta". Ele sente dor. Vc avisa. As enfermeiras dão remédio. A dor não passa. Vc passa a vigiar o sobe e desce do peito obssessivamente.

15 de outubro. A médica passa de manhã, com cara de pouca esperança e muita preocupação. Ele se comunica mal. Reclama de dor nas costas. Vc espera o café da manhã e reza pra alguém chegar logo. Vc quer sair dali correndo. Vc não quer sair dali. Vc quer que haja algo a ser feito. Nove horas. O café chegou. Ele pede queijo. Não tem. Toma meia xícara de café com leite, não come nada. Vc precisa ir e sai minutos antes da medicação. A despedida é rápida. Um aperto da mão no ombro porque vc não alcança a cama para beijá-lo. Deixa a promessa de que a filha dele chegará logo. Fora dali o nome da sensação é medo, vergonha e ignorância. Um medo aterrorizador de que ele morra sozinho só porque vc quer dormir um pouco antes de trabalhar. Vergonha por fazer tão pouco, por assistir alguém tão querido perdendo pouco a pouco tudo o que se é. O corpo, a comunicação, a dignidade. E a ignorância em essência. Não saber e pensar que sabe. Depois do trabalho vc vai ao cinema. Em parte pra não voltar pra casa, em parte porque isso deu certo da última vez. Agora vc sente raiva. De tudo, de todos. Antes de dormir vc pede a todos os deuses, todos os santos e a todos os mitos que seu avô pare de sentir dor, que tenha conforto e dignidade. Vc pede desculpas por não ser humilde o suficiente para pedir o melhor pra ele e assume a responsabiliade de pedir que ele descanse. Que não seja pra ele melhorar e continuar sofrendo aos poucos. Vc dorme enquanto reza e chora.

16 de outubro. O telefone toca. É seu tio. Medo. Você não atende. O telefone toca. É seu pai. Medo. Você tem que atender. A tecnologia faz sua parte. Estão todos se falando ao telefone. Todos os filhos e você, o mais velho dos netos. A médica disse que o remédio não está fazendo efeito. Ao badalar da meia noite fará 48 horas e, se nada mudar, terão que escolher entre o conforto do quarto e a vida a qualquer preço da UTI. Discussão. Todos falam ao mesmo tempo. Sua tia começa a descrever a noite de dor dele e desespero dela. Fica combinado que todos se encontrarão de noite no hospital. Telefone desligado. Vc pensa que deveria ir agora ao hospital. Mas não vai.

16 de outubro, 17h15. Vc vê que seu tio ligou. Vc retorna pra ele. A frase é "o vô parou".

A adrenalina sobe para o cérebro, mas a memória falha. Você foge, correndo, para a razão. Providências, coisas a fazer. É você quem vai dizer pra sua tia, pra sua irmã, pro seu irmão. Conta pra sua chefe. Termina de fazer coisas as coisas do trabalho, adrenalina que não pára. Sai de lá correndo, atravessa a passarela correndo, entra no primeiro ônibus que passa. Precisa avisar seus amigos "meu avô está a cruzar o grande rio". Não consegue parar de pensar nas moedas. Quer que ninguém saiba. Quer que todos saibam. Chora quando desce do ônibus. Seca as lágrimas na esquina do hospital. Sorri ao abraçar seu tio. Substâncias químicas desconhecidas te fazem racional, calma, prática, quase cruel. Você ouve como tudo se passou pela primeira vez. Ouvirá ainda mais duas vezes. Maneja o celular com a destreza de um espadachim. De repente, você está numa sala ao lado do seu tio. Ele não consegue parar de olhar os caixões. Você não quer vê-los. Escolhe-se hora e local. Escolhe-se o caixão, encomenda-se as flores. Caminha-se de volta ao hospital. Agora é sua tia quem chega. A adrenalina dela age na fala, o maior legado da família, além da teimosia. Pouco tempo depois, seu pai chega. Você perscruta o rosto dele procurando dor. Graças a deus, não encontra. Você não vai precisar abraçá-lo, não vai afogar toda a racionalidade que te salva.

A noite corre. Lugares a ir, coisas a fazer, pessoas a encarar. Você vê seu avô no necrotério, terminando de ser vestido. Sem caixão, sem velas, sem flores. E é só o corpo. Ele mesmo não está lá, mas é como se estivesse e como há muito tempo não estava. Ali, sem a expressão de dor, usando calça e camisa, sem a perna dobrada, sem cheiro nenhum, parecia que o corpo dele era dele novamente e que, assim sim, poderia abandoná-lo."



Eu nunca tinha visto um corpo sendo colocado no caixão. Nós, sem nós mesmo, somos mais moles que um boneco. Mesmo com cuidado, o corpo cai dentro do caixão, e o barulho é o de um boneco de pano muito pesado. A pele é amarela. As mãos também. Sem a respiração, é impossível pensar que há ali mais que um corpo. O pouco de espiritismo que sobrou em mim, me fazia sentir que ele estava ali perto, ao lado dele mesmo. Minha tia falava com ele como se ele estivesse vivo "está tudo bem, pai, agora você não vai mais sentir dor". "Eu vou junto com você.", disse ela. "Não toda a viagem", disse eu. Eu queria pegar a mão dele, mas eu não podia pegar aquela mão, porque aquela estava morta e não era dele.

No caixão colocaram cravos brancos e rosas vermelhas. Ficou bonito. Minha tia pôs no bolso do paletó uma foto antiga, de quando ela era muito pequena e estavam todos juntos no sítio do interior. Até o cavalo. Meu pai trouxe imagens de jesus e de nossa senhora. Escolhi o Jesus mais feliz e o Santa menos triste. A santa ficou nas mãos, o Jesus, no peito. Rezamos porque é a única coisa que ainda se pode fazer. Senti falta de ter fé, porque diferente de quase todo mundo ali, eu não sabia o que ia acontecer com ele agora. Não sabia nem se "ele" ainda existia de alguma forma. Amigos e conhecidos chegaram em profusão. Eu não sabia, mas isso é importante. Distrai a nossa dor, alimenta lembranças alegres, nos deixa livres para cair por sabemos que haverá quem ajude a levantar. Minha irmão fez a última preleção antes de fechar o caixão. Depois foi feito o Pai Nosso, o Ave Maria e uma pequena prece que ele mesmo nos ensinou e eu, confesso, não sabia que lembrava: "Con dios me deito, con Dios me llevanto. Con a Virge Maria y el Espírito Santo. En esa cama hay cuatro angeles, un en cada canto, que dicem, vá, descansa no temas ninguna cosa."

No cemitério, chovia muito. O buraco era fundo. No fim, de uma forma que eu não sei explicar, eu nos vi de costas. A cova aberta, o coveiro dentro colocando o caixão do meu avô e mostrando a caixinha com os ossos da minha avó que fôra exumada no mesmo dia porque não tinha vaga no túmulo. Ao lado, todos juntos, um segurando o outro por medo de que escorregasse, eu, meu pai, meu irmão, meu primo e minha tia a assistir a sepultura sendo fechada por placas com pinceladas de cimento e muita terra por cima. A última fotografia de que meu avô participaria.

Não ficou remorso, nem culpa. Eu os procurei incansavelmente dentro de mim, e não os tenho. A saudade que me abala é a saudade do passado, sem vontade nem desejo. A única coisa que me dói é o medo que sinto por ele. Um medo que só existe porque não tenho nenhuma fé religiosa e verdadeira que me console. Tenho medo que ele esteja sozinho sem entender o que as pessoas dizem e sem ninguém para traduzir. Tenho medo que ele esteja em algum lugar horrível pagando expurgando pecados ou coisa assim. Tenho medo que esteja sofrendo por teimar algo que não é, sei lá, real. E a única coisa que eu sinto agora, o tempo todo, é um enorme e profundo vazio.




domingo, 27 de setembro de 2009

Diferencial Diagnoses

O processo é simples. Primeiro sentar e respirar. Depois organizar o caos, retirar o que atrapalha, eliminar (nem que seja literalmente) as desculpas. Por fim, ver-se frente a frente com o que resta (ou deve, como queira) ser feito, para que certa teoria seja confirmada. Penso que isso também vale para os objetivos. E os sonhos.

Eu minto tão mal que meu pai percebeu que a mentira que eu escondia dele era verdadeira. Claro que ainda não temos uma solução, mas ele já sabe, ou melhor, nós já sabemos, que passar os finais de semana em outra cidade cuidando do meu avô não me faz bem. Ele não sabia, mas eu não conseguia mais esconder o mal estar que me acomete sempre que o final de semana se aproxima. Todas as semanas. Se alguém tivesse gravado minhas ligações, perceberia que a raiva que emana da minha voz toda sexta-feira não é humana. Isso sem falar nos sintomas que o meu mais-que- consciente estava desenvolvendo pra ver se eu me safava. De cefaléias bizarras a contrações abdominais.

Dois finais de semana de folga depois, ou melhor, antes de um colapso total, eis que eu me vejo diante de uma mesa arrumada e pronta para começar o que deve ser feito. Estudar. A casa não está uma zona, os gatos comeram, eu já jantei. Isso sem falar que venho tomando café da manhã todos os dias há mais (senão exatamente) de duas semanas. Estou até escrevendo um post.

O que causa caos pessoal, desatenção no trabalho, fuga e mediocridade aguda?
Diagnóstico: Cansaço.

E o que causa o cansaço?

Não é a vida, nem a situação com meu avô somente. Ela, a situação, é apenas, digamos assim, um estresse não intencional que levou ao agravamento dos sintomas subsequentes. Ou seja, cansaço pode ser a resposta mas não é a causa. Já antecipo que eu realmente não sei a causa, mas tenho algumas teorias.

Primeiro, os sintomas surgidos com o cansaço não são novos. Desde sempre, se as minhas coisas (e por isso entenda-se meus papéis, minha casa e minhas roupas) estão na mais profunda bagunça, é sinal de que algo não anda bem. Se eu passo muito tempo arrumando-as, demonstra-se uma tentativa quase frustante de, arrumando o exterior, fazer o mesmo com o interior. Sinceramente falando, eu sou a mestra das fugas. E sou melhor ainda em fugir das coisas que eu não gosto de fazer. Ninguém vai me ver fugindo de um bom prato de macarrão, de um livro novo do Harry Potter, ou de uma boa oportunidade de sexo. Não. Mas eu fujo de um almoço sem graça, de um livro chato, ou de um cara que só sabe brincar com o próprio brinquedo.

Por outro lado, não fujo em desabalada carreira para qualquer lugar. Só quando estou em pânico, mas aí não conta. A fuga em mim se manifesta de duas maneiras: 1. Correr em direção ao que eu quero, ainda que não pelo caminho real. 2. Autosabotagem.

Vou começar pelo fim. No segundo caso, na hora parece não fazer sentido, mas depois é praticamente uma tabela do excel. A sabotagem é sempre semi-inconsciente, baseada em argumentos realmente ruins, que na hora fazem muito sentido. Eu me autosaboto para me proteger. É, bizarro, eu sei. Por exemplo, se eu não estudei para uma prova. Não posso simplesmente não ir ou não responder as questões. Não. Mas posso beber feito louca na noite anterior e ir direto do motel para a prova. Ou, acordar na hora, tomar banho e perder os óculos antes de sair. Ou ainda, sair no horário exato para a prova e chegar lá no exato momento em que os portões fecham na minha cara. Eu sou tão boa nisso, que na hora da dor (ou raiva) maior, eu tenho certeza que a culpa não é minha. Depois, bem depois, não faz diferença, e eu me salvei de falhar por pura incompetência. Não foi não estudar que me fez não passar.

Como na música, o movimento da fuga é mais sútil e muito mais divertido, com efeitos colaterais mais fortes e, na maior parte das vezes, muito mais agradáveis. As vezes ilusórios, verdade, mas não sempre. Por exemplo, estou andando/correndo uma hora três vezes por semana. Sim, foi porque eu vi o House correndo. Mas ele já não corre mais, eu sim. Eu não fujo assistindo qualquer coisas. Vejo séries médicas e dramas humanos em doses cavalares, lavo o banheiro para não abrir a apostila, estendo roupa atrasada para ir trabalhar, passo horas fazendo nada na internet, brinco com o gato, faço listas imensas de coisas que eu devo fazer mas que, honestamente, não fazem muito sentido.

Sintomas. Diagnóstico que explique todos os sintomas?

Hoje eu ouvi uma entrevista com a autora do livro Mentes Inquietas, falando sobre o Deficit de Atenção e de como ele pode persistir em adultos. Eu não me encaixo em todos os sintomas. Pra falar em verdade, só em um (além dos transtornos causados pelo não tratamento da condição). Ela disse que a criança com o déficit se dedica a coisas pelas quais ela se apaixona. É capaz de passar horas fazendo (lendo, estudando, montando, pintando, qualquer coisa) aquilo. Não como todas as pessoas, mas de forma profundamente concentrada. Eu sou assim, e não estou me gabando. É quase doentio. Eu li "A ordem da Fenix" em 28 horas sem parar para ir ao banheiro. Assisti a 3a temporada do House em uma semana. Passava a tarde toda na biblioteca estudando bioquímica sem comer. Isso sem falar nas coisas estúpidas que fiz por um cara. Até concordo que isso não é lá muito salutar, mas eu não quero ser como as outras pessoas, incapazes de ler um texto por mais de meia hora.

O problema, e sim, já estamos chegando ao fim do texto, é que eu preciso desta paixão para fazer as coisas. Assim: eu quero muito, mas muito mesmo, ser médica. Só que não tenho o menor tesão em ficar estudando coisas que eu já estudei por quatro anos! Elas estão apagando da minha memória, mas eu lembro perfeitamente que eu já vi isso. E não acho nada divertido ficar sentada resolvendo problemas de MUV quando eu podia estar aprendendo, sei lá, funções hepáticas alteradas. Então, pausa, eu preciso de algo que lembre, sensorialmente, o porquê de fazer essas coisas. E aí, entra a ficção e as séries médicas!!!

No melhor estilo House: a paciente tem DDAH não tratado, o qual, além de causar surtos depressivos e síndromes de ansiedade, se manifesta através de uma necessidade de tesão para seguir em frente. As séries médicas que ela consome em profusão suprem essa necessidade, e os exercícios físicos mantém a adrenalina e a endorfina altas. A necessidade da administração desses remédias está condicionada à situação atual. Voltando a paixão, desaparece o cansaço, e, consequentemente, a fuga e a autosabotagem.

Eu não sou apenas uma viciada. Eu sinto uma espécie do dor e preciso disso para me manter focada.

E realmente me identifico com o House.

sábado, 12 de setembro de 2009

Do absoluto desconhecimento no mais profundo siginificado de si.

Então acontece que eu simplesmente não sei. Não sei. E queria tanta coisa. E as coisas que eu não sei sufocam as coisas que eu queria. E eu continuo ali (e aqui) com as mesmas manias.

Eu não sei como seguir em frente. Eu não sei o que fazer para continuar vivendo. Eu não sei o que fazer para fazer acontecer coisas que alguns chamariam mudanças por não saberem que sempre estiveram em mim. E eu queria parar de começar as frases com "e" e "então". E eu queria não chorar tanto. Queria dizer coisas boas no twitter, pensar coisas menos amargas, não imaginar desgraças, mortes e fatalidades o tempo todo. Queria voltar a mentir tão bem como eu fazia antes. E se eu digo queria é porque eu não sei se ainda quero. Penso que sim, mas não sei.

Ah, mentir como antes. Antes eu era boa nisso. Muito boa. Eu tinha dívidas, amores perdidos, trabalho atrasado, sonhos frustrados, e ninguém tinha a menor idéia disso. Eu era tão leve para as outras pessoas que ninguém pesava pra mim. Eu mentia tão bem que tinha dias que eu mesma chegava a acreditar que estava tudo bem. E dormia bem e acordava no dia seguinte pronta pra resolver tudo o que fosse necessário.

Antes eu era boa em muita coisa. Hoje eu sou menos que um arremedo, um imperfeito simulacro. Hoje eu me sinto "A tempestade" do Renato Russo. Por causa de antes, todos me tratam como se eu fosse forte, indestrutível, pau pra toda obra. Joga aqui que eu aguento. Claro que a culpa não é das pessoas. Nem minha. É bom ser forte, é legar ter respostas e quase sempre encontrar meios de resolver tudo. Hoje eu ainda encontro os meios, eu só não me divirto mais como antes.

Renato Russo. "Um dia pretendo tentar descobrir porque é mais forte quem sabe mentir." Não sei se eu quero mesmo descobrir. Só sei que eu "não quero lembrar que eu minto também" nem que eu não minto tão bem.

Sim, eu sei. Os problemas estão todos na minha cabeça e são todos produtos das minhas limitações. Eu só não sei como ir além delas, porque muitas delas estão misturadas com meus princípios.

Não sei. Acho que nem mesmo Sócrates pensou tantas vezes nessa sentença como eu. Ok, talvez Sócrates tenha pensado mais. Com certeza Nietzsche pensou. Mas eu não quero acabar tomando feliz uma taça de cicuta, nem acabar presa por abraçar chorando um cavalo. A sensação de proximidade que as leituras de Nietzsche me causam me assustam. Pois que tenho um medo insano de ficar louca. O medo, para ser exata, é o "losing my mind". Perder minha mente. Porque ela é a única coisa de profunda e exclusivamente minha que eu realmente tenho.

Por favor, entenda, eu sou egoísta. A maior parte do meu sofrimento advém de eu não poder exercer isso. De não ter o meu tempo para mim, de não ter o meu dinheiro pra mim, de não usufruir da minha casa, de não poder exercer os meus talentos como eu gostaria. O que eu digo é tolhido pela circunstância, o que eu visto é controlado pelo ambiente. Só o que eu penso é meu, só meu. E eu gosto muito disso. Ninguém sabe, ninguém pode me pressionar a pensar ou não pensar, porque, de fato, ninguém sabe.

A coisa toda é uma tristeza tão grande que traz consigo, senão a certeza, uma indubitável sensação de envelhecimento. Não irreversível, mas opressor. Eu reclamo da vida. Eu sinto dores. Eu só falo de mim. Eu desenvolvo doenças inexistentes do sono. Eu sinto raiva. Muita raiva. E aquela minha velha conhecida voltou. Sim, aquela vontade anti-schopenhauriana de não existir. Como eu queria não existir. Simples assim. Não existir. Desvanecer. Fad away.

Não é morrer (não que eu não queira, mas isso vai acabar mesmo acontecendo um dia, então não preciso me preocupar), é não existir. Porque quem não existe, não existirá nem nunca existiu. Nada pode advir do inexistente. Ninguém sofreria (eu, muito menos). E como a gente (em tese) não pode simplesmente de-existir, acho que Leibniz estava errado: este não é o melhor dos mundos possíveis. Lá sim, a gente poderia deixar de existir.

Não há muito mais o que falar. Escrever mais seria redigitar uma ladainha tantas vezes contada em todos os meus blogs anteriores. Seria republicar muitos dos meus últimos twitts. Seria quase como passar a limpo meus diários da adolescência. Se eu escrevo é porque eu não quero falar sobre isso e, mais uma vez, parece que todos os outros são incapazes de entender isso. Não entendem porque não conseguem acreditar. E não conseguem acreditar porque acreditam que falar resolve as coisas. Não, eu acredito que falar não resolve tanto. Fazer resolve.

Não, não há nada mais o que escrever. O resumo é tão simples que quase ofende: estou triste, estou cansada e me sinto perdida, como quem não sabe como chegar lá onde sabe que quer ir.

"Ausente o encanto antes cultivado
Percebo o mecanismo indiferente
Que teima em resgatar sem confiança
A essência do delito então sagrado
Meu coração não quer deixar
Meu corpo descansar
E teu desejo inverso é velho amigo
Já que o tenho sempre a meu lado
Hoje então aceitas pelo nome
O que perfeito entregas mas é tarde
Só daria certo aos dois que tentam
Se ainda embriagado pela fome
Exatos teu perdão e tua idade
O indulto a ti tomasse como bênção
Não esconda tristeza de mim
Todos se afastam quando o mundo está errado
Quando o que temos é um catálogo de erros
Quando precisamos de carinho
Força e cuidado
Este é o livro das flores
Este é o livro do destino
Este é o livro de nossos dias
Este é o dia de nossos amores"
(O Livro dos Dias - Legião Urbana - Composição: Renato Russo)

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Sobre a solidão



Eu penso que algumas pessoas se enganam sobre a solidão. Algumas, pra não dizer muitas, pra não dizer quase todas. Ou, o que também é possível, só algumas que conseguem fazer parecer que são todas. Tantos filmes e tantos livros e tantas conversas perdidas nos trens e nos ônibus falando sobre como é importante não estar sozinho naquelas horas, naques dias. Nas horas terríveis, nos dias surreais. Na morte, na doença, na desilusão. Não discuto isso, a simples presença de alguém, quem quer que seja, evita inúmeros suicídios. Principalmente das pessoas que não querem de fato morrer, só querem não estar vivas ali e naquela hora.

O ponto é que, nessas horas, basta ter alguém. Claro, alguém que será inesquecível, por quem gratidão nenhuma no mundo será suficiente e cuja memória estará para sempre preservada. No meu caso, eu lembro daquele colega no velório e da minha melhor amiga me fazendo prometer que eu não iria me matar nas crises de depressão da adolescência. São pessoas que teriam de inventar algo de profundamente ruim para poderem sair do Panteão. Eles estavam lá, naquela hora, naquele dia e foram alguém insubstituível e valioso. Mas não são (ou não são mais) a "minha pessoa". Solidão é quando você não tem a sua pessoa. A solidão mais assustadora é quando você não tem mais. E a absoluta é quando você nunca teve.

Então quem é a sua pessoa? É o nome escrito na linha da agenda "em caso de emergência avisar a". O nome que não é o do seus pais. A sua pessoa é pra quem vc liga pra contar que seu gato entrou no apartamento da vizinha atrás do cheiro bom da comida dela. É aquela que tem o endereço dos seus blogs, de todos eles. Nas palavras da Cristina Yang, de quem eu roubei o conceito, "é quem te ajuda a enterrar o corpo." Pra quem vc liga (antes do seu pai) quando passa no vestibular. Ou melhor, é quem já sabe que vc passou no vestibular porque ficou olhando na internet desde que acordou, e que sabe que vc detestaria (ou não) que alguém te contasse antes. Vc sabe que ele ou ela é essa pessoa se ela já atende o telefone gritando, ou, dependendo do caso, já está na sua porta coms as garafas de champanhe.

Por óbvio, ela estará lá naquele dia, naquelas horas. Porque ela sabe que certas dores são profundas e intangíveis. Mas ela estará também em todos os outros dias porque também sabe queo cotidiano é capaz de fundar e perpetrar dores mais agudas, mais constantes e mais abrangentes. E, por isso mesmo, de um dano muito mais irreparável. 

Falo aqui de um tipo de ligação covalente, não dativa. Ser ou ter alguém assim é, antes de tudo uma relação de prazer e necessidade. É ficar de feliz de ouvir e feliz de contar. É precisar compartilhar. É algo tão perfeito que não parece real, mas que não se quer questionar a realidade.

De uma perfeição tão exata que, talvez por isso mesmo, eu só tenha vista na ficção e na poesia. E, talvez também por isso mesmo, eu sinta tanta falta de alguém assim. Com certeza por isso mesmo, eu me veja tão claramente na Cristina: porque certas pessoas, como nós, tem por missão entreter o Destino. Porque nós não somos "aquela pessoa". E porque a arte comete o crime de denunciar o belo na tristeza e na solidão, sem nunca saber o quanto de dor traz a incompreensão, causa e consequência de todo estar sozinho.

Sob o efeito de "In the midnight hour", "All by myself" e "Wish you were here" - Capítulos 9,10 e 11 de Grey´s Anatomy.

"Quando você é criança a noite é assustadora porque há monstros embaixo da cama. Quando você cresce, os monstros são diferentes. Dúvida. Solidão. Arrependimento. E embora talvez você seja mais velho e mais inteligente, você ainda continua com medo do escuro. " Meredith Gray

"- ... Sinto raiva de um órgão. Eu não sei. Talvez eu não querira fazer cirurgia geral afinal. Talvez precise de um novo desafio. Talvez preciso fazer algo que me balance na base. Talvez eu só esteja cansada. 
- Ok. Estar cansada. Não é? 
- You tired too?
- Exausta. profundamente exausta. Eu só queria... Não sei. Mas quero algo.
- Então somos duas (três, contando comigo)" Miranda Bailey e Callie Torres

"Sleep. Is the easy think to do. You just close your eyes. But, for so many of us, the sleep is out of alcance. We wanted, but we dont know hoy to get it. But when we face our deamons, we face our fears, and turn to each other for help, nighttime is not so scarry because we are not alone. In the dark." Meredith Gray.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Si es cuestión de confesar...

Se vamos começar aqui, é bom que algumas estejam mais ou menos claras. Primeiro, eu não sou uma grande amiga de Descartes. Pra falar a verdade, nem conheço o cara direito. Talvez (ou principalmente) porque não sou tão esperta quanto ele. O cara cria uma dúvida hiperbólica e sai dela com algumas conclusões (verdades, para os fãs) "certas e indubitáveis". Já começa sabendo que existe. No meu caso, criaram a porra da dúvida e eu afundo cada vez mais nela.

A segunda coisa a declarar de antemão é a minha admiração, respeito e quase completa adoração à antítese e ao paradoxo. O "mas" e o "também" são palavrinhas muito queridas por mim. Por exemplo, eu não gosto de Descartes mas ele é foda. Ou, Descartes é um idiota e também um gênio. 

A terceira e última revelação da noite é o que muitos colocariam em primeiro lugar: eu sou uma fêmea. Claro, não é por mérito ou desmérito meu, é simplesmente algo que é. E como algo que é, traz em si características intrínsecas que devem ser observadas. A principal delas, na avaliação do momento, é que eu tenho hormônios. Ou melhor, fluxos mutáveis e insanos de hormônios. Hormônios tão poderosos que não raramente conseguem contaminar o próprio ato de pensar. A dicotomia pensar-sentir torna-se passível de identificação apenas a posteriori.

E o que tudo isso significa? Significa que, às vezes, não saber das coisas, seja dos grandes mistérios metafísicos ou das mais insignificantes coisas, dói em mim fisicamente, traz consigo uma tristeza inconcebível, uma solidão irreparável, uma incompreensão imensurável. Mas no dia seguinte passa. Ou não.


Ao som mental de Inevitable (Shakira)
"Si es cuestión de confesar, no sé preparar café, y no entiendo de fútbol. Creo que alguna vez fuí infiel, juego mal hasta el parqués y jamás uso reloj. Y para ser más franca nadie piensa en ti como lo hago yo, aunque te dé lo mismo. Si es cuestión de confesar, nunca duermo antes de diez ni me baño a los domingos. La verdad es que también lloro una vez al mes, sobre todo cuando hay frío.  Conmigo nada es fácil, ya debes saber, me conoces bien, y sin ti todo es tan aburrido. El cielo está cansado ya de ver la lluvia caer y cada día que pasa es uno más parecido a ayer. No encuentro forma a alguna de olvidarte porque seguir amándote es inevitable. Siempre supe que es mejor cuando hay que hablar de dos empezar por uno mismo. Ya sabrás la situación: aquí todo está peor pero al menos aún respiro. No no tienes que decirlo, no vas a volver, te conozco bien. Ya buscaré qué hacer conmigo. Siempre supe que es mejor cuando hay que hablar de dos empezar por uno mismo."
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